2017-04-03

Uma história inesquecível: Augusto Ferreira Gomes e Aquilino Ribeiro


Uma história inesquecível: Augusto Ferreira Gomes e Aquilino Ribeiro

Tocando-se, influenciando-se ou dando-se à amizade e camaradagem, as pessoas comunicam e são sutura. Há histórias de atores fluviais do tempo que, de deslembradas, permanecem esquecidas, adormecidas. Talvez não haja outro escritor português assim, como Aquilino, imerso em bordões e epítetos nada significativos, porque os apodos vulgares são mesmo isso, vulgares e insignificantes.
Sem espoletar que não seja em afloramento a classificação regionalista ou a tal impresença da digladiação modernista, lembro, ao correr da pena, que em matéria aquiliniana não há grilhetas, barreiras ou muros – pelo contrário, nele, bloco criativo multímodo, radica o fogo criativo da descoberta e do risco.
Vem este arrazoado a propósito do livro No claro-escuro das profecias (Lisboa, Portugália Editora, s.d. [1941].), de Augusto Ferreira Gomes, com a dedicatória alta “À memória do astrólogo Fernando Pessoa”. Ferreira Gomes foi, a partir da morte de Mário de Sá-Carneiro, o principal amigo de Pessoa (Bréchon di-lo “o melhor amigo de Pessoa”, p. 570.) e, como o defende o mesmo Robert Bréchon, o seu guia da astrologia (Robert Bréchon, Estranho estrangeiro. Uma biografia de Fernando Pessoa, Lisboa, Círculo de Leitores, 1997, p. 315.).
E é já meio do livro que se dá o encontro de dádiva, de parceria, entre Ferreira Gomes e Aquilino – a fim de provar que a gravura do século XVII não é, como Fontbrune defendia, Paris, sendo antes, como o comprovaria uma gravura do século seguinte, Londres. O nó, que á laço também, surge na nota da p. 89: “A gravura de Londres do século XVIII foi-nos cedida pelo escritor Aquilino Ribeiro e já serviu para a capa do seu livro O Cavaleiro de Oliveira.” Mas deixemos o incêndio de Londres, que Ferreira Gomes vê em edição holandesa de 1668 das Profecias de Nostradamus, e perguntemos apenas – estará nisto uma sugestão de Aquilino?
Mar vasto é a obra de Aquilino, que todos os dias se adenda e complementa – não cessem trabalhos, nem dias.
Viseu, 3 de abril de 2017

Martim de Gouveia e Sousa 

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