2016-01-09

Aquilino e o romance «O coro dos defuntos», de António Tavares


Aquilino e o romance «O coro dos defuntos», de António Tavares

Eu não conheço António Tavares e ainda bem. Ou melhor, o prémio Leya 2015, que António Tavares ganhou, tendo o mérito que tem, criou em mim um horizonte de expetativa que, infelizmente, não pude confirmar. Culpa minha, decerto. Mas será assim?
Vejamos. O vezo aquiliniano que o autor integra (epígrafe, evocação, titulações capitulares, palavras e colaço glossário), subindo o objeto literário a alto lugar pela figura do cotejo (com Aquilino, em primeiro, e, já agora, com a releitura do debutante Vergílio Ferreira de O caminho fica longe), criou em mim, lido o romance, uma flagrância – a de estarmos perante um objeto demasiadamente flutuante, insuscetível ainda de espanto ou fulgurância literárias.
Estimável, sem dúvida, mas aquém, talvez muito, da estratégia da influência evocativa de um mestre que veio para o palco das letras com um já muito forte Jardim das tormentas. Cavando um início fortíssimo naquela admonição de tratar-se de um romance «evocativo da obra de Aquilino Ribeiro», ultrapassado o motivema ambiencial de Aldeia, não sei se aquele freio linguístico a que o autor prende Aquilino é, sequer, simpático: «Se não conhecer estes termos, o leitor interessado poderá consultar o glossário no final do livro.» Mas será Aquilino isso, uma matéria para glossários? E o dito glossário seria, de facto, necessário?
Estimável, sim, não admirável. Há a influência, os ambientes e os sopros aquilinianos, sim. Há ainda a originalidade e uma certa versatilidade narrativa, sim. No entanto, os 67 curtos capítulos são muitas vezes exemplo de uma narrativa en passant, antes parecendo declinada ao ritmo de anuários, almanaques ou agendas factuais. Dúvidas ainda sobre algumas soluções (desaparecimentos, calão,… )e as «maçãs de bravo-de-esmolfo». Gostei, mas esperava mais. Afinal, trata-se de um objeto aurático que todos devem consumir, não é?

Viseu, 9 de janeiro de 2016

Martim de Gouveia e Sousa

Sem comentários: