2014-06-27

[botânica]

[botânica]

fulgurante o peso do mundo
é um altar barroco nas mãos
onde as veias são mulheres
largando duas pétalas de sangue.

botânico  todo o amor é isto –
uma mão reversa e a pele.

2014-06-22

[uma a uma vêm]

[uma a uma vêm]

afundam-se nas unhas as palavras
e então a tremura vem aos dedos
desde a porta mais longe o coração
debruça-se na pele na palma da mão bate
como uma ciência essencial inexplicável.

2014-06-20

pensamento assistido por Antoine de Saint-Exupéry


«Os fracassos fortalecem os fortes. Infelizmente, contra os homens travamos um jogo onde pouco conta o verdadeiro sentido das coisas. Ganha-se ou perde-se com aparências, marcam-se pontos miseráveis. E damos por nós amarrados por uma aparência de derrota.» [Antoine de Saint-Exupéry, Voo nocturno, Lisboa, Difel - tradução de Carlos Leite].

E assim se perde na vitória.

2014-06-19

[por fim]

[por fim]

como dedos o fogo esta iluminação de palavras
o rapto do vento como antigo salto no silêncio
os líquidos da memória inundando o pescoço
indo ao peito em dança sedutora na pele sendo
um rápido comboio que é lâmina nela cortando
uma metáfora verde encostada à pedra à lítica
palavra correndo toda uma vida dentro da casa.

uma vez a mesma palavra uma vez a última.

2014-06-12

[fernandes jorge]


[fernandes jorge]

é uma questio de aqua et terra
o mar de junho dentro de mim
a liquidez do tempo defluente
mergulhando húmida na casa.
 de junho que repudio? nada.
esta água em mim junho nisso.

2014-06-11

Herberto Helder, «A morte sem mestre», 2014.


«não sei se fazer um poema não é fazer um pão»

[Herberto Helder,  A morte sem mestre, Porto, Porto Editora, 2014.]

2014-06-10

[o corpo és]

[o corpo és]

podes não dizer quanto de vento te respira
quanta imagem vinda do tempo te envolve
podes mesmo irrespirar brandamente morrer
nos punhos nos pactos de sangue na língua
talvez engulas todos os silêncios e fascínios
do sal ao corpo rumorosa a água devora-te
lustral de ti fazendo o que és – um símbolo.

2014-06-04

«Serão as aves azuis?» - texto de Anabela Silveira e encenação de Carlos Clara Gomes


Transmigradas e reais, eis que a luz incide em três grandes figuras da cultura viseense e nacional. Este é um encontro com Augusto Hilário, Beatriz Pinheiro e Carlos de Lemos - uma orquestração em azul, imperdível.

2014-06-02

[todos os dias as águas]

[todos os dias as águas]

todos os dias as águas os gestos irrepreensíveis os ventos
são a madeira com que restauro o fel da proa os  verdes
aéreos do tempo a inteireza da erosão o número exato
da contemplação e todas as certezas logo caídas na ilha.

sombrio o silêncio sopra a fome súbita a chama que sou.