2013-03-25

"Os amantes clandestinos e outras inutilidades poéticas" de Manuel de Lima Bastos




Abrindo com cláusula eugeniana, logo o segundo elemento titular dispersa cataforicamente o mero fulgor amoroso - toda a inutilidade é poeticamente útil, di-lo a sabedoria da poesia.
Deitados ao tempo, estes amantes são o pó que ressuma na memória proveniente de antiga joeira sentimental, "como velhos peixes de olhos glaucos / imóveis na profundidade". Em ascese, todo o sujeito lírico haverá de sonhar com a "improvável visita do amor" - poderia o sonho não a afirmar como útil tautologia?
O "tempo não chega" dirá o poeta neste rito clandestino de cultuação da indenegável beleza presente em cada laceração feminina, em cada esquiva visão quotidiana da mulher real-transformada. Os semas utilizados são muitas vezes admonitórios da incapacidade do sujeito poético dar conseguimento às suas pretensões, lavrando em enigma essa busca de absoluto com comparações. condições e modos fugazes.
Cinérea é ainda a tonalidade expressiva. "Olhos tristes" e "luz sombria" são aqui mera exemplificação da isotopia dolorida que percorre todo o macrotexto.
Sobre o caráter terrível da palavra 'não', que Vieira eternizou, fala ainda esta poesia, diz esta voz de Manuel de Lima Bastos que percorre a impossibilidade e a finitude em fogo que é essência da logotetia. "Entretanto virá o tempo fazer" o seu trabalho para que estes amantes, isto é, esta singular poesia, rompam os lindes da clandestinidade.

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