2013-12-29

Cesário, mestre da literatura portuguesa


Cesário Verde, em estranheza que o tempo tornou fulgurante, é o mestre de muitos. Por exemplo, de Pessoa e de João de Araújo Correia, «o mestre de todos nós». Encontramos essa nota na justíssima crónica «Mestre Cesário Verde»:

«Cada palavra de Cesário Verde é uma sugestão de coisas maravilhosas. Não se podem contar nem exprimir. Mestre de mestres, o Cesário Verde...» [João de Araújo Correia, «Cartas da Montanha», Régua, Imprensa do Douro, 1955, p. 149.]

Cesário, mestre de mestres...

2013-12-26

João de Araújo Correia, Pascoaes e a língua


É uma alegria ler aquela crónica de título «Pascoaes e o idioma» e mais se ficar a admirar João de Araújo Correia e Teixeira de Pascoaes, assim «pequenino, leveiro, afectuoso» (p. 64). De conversa funda e variada, Pascoaes não esquecia nunca a fundante Língua Portuguesa. Assim discorre, a propósito, Araújo Correia:
«Disse, de reformas ortográficas, o que Mafoma não terá dito do toucinho – se acreditarmos em escrevedores de polpa no capítulo Mafoma.»
Corroborando Pascoaes, o autor de Cartas da Montanha (1955) adianta ainda:
«Dei razão a Teixeira de Pascoaes, cismando entre mim que as reformas ortográficas impõem a escritores pensantes (…) muito disparate. Misturam, no mesmo tacho, o assimilável e o indigesto. Se não houver cautela, desarranjam a máquina de quem é são e escorreito.»
E segue a crónica, que transcrevo, com as palavras de Pascoaes:
« - Quem ofende a Língua ofende-me a mim. A Língua é a minha dama. Se não fosse a Língua, que seria eu? Se não fosse a Língua, eu não seria nada…
Meditem-se estas palavras simples de Teixeira de Pascoaes. Meditem-nas os meus amigos, aqueles que choram o tempo e o latim que às vezes gasto, defendendo o Idioma. Considerem o que sou, pouco ou muito, mas admitam que eu não seria nada se não fosse o Idioma. Deixem-me ser grato a um credor que nunca me incomodou. Para lhe pagar juros de juros, merece que eu o sirva, sem remuneração, até o fim da vida.
Se há mal nisto…
A Língua Portuguesa, pela maneira como aí se fala e se escreve, é a meus olhos uma cidade maravilhosa desconjuntada pelo furor dum terramoto. Por entre escombros, espreitam mármores divinos. Cumpre a todo escritor desenterrá-los.
     Abril – 1953. [João de Araújo Correia, Cartas da Montanha, Régua, Imprensa do Douro, 1955, pp. 66-67]  


Mas quem quer mal aos mármores divinos?

2013-12-21

OS LIVROS DE 2013: Gonçalo M. Tavares, «Atlas do corpo e da imaginação (Teoria, fragmentos e imagens)», Lisboa, Caminho, 2013 (setembro).


OS LIVROS DE 2013: Gonçalo M. Tavares, Atlas do corpo e da imaginação (Teoria, fragmentos e imagens), Lisboa, Caminho, 2013 (setembro).

Como uma volição, este atlas atravessa o corpo e é uma central de pensamento, abrindo caminhos, dialogando, interiorizando o exterior individual e interpretando. Alarmante, porque alarmado o «incipit», é sob o signo do pensamento que o corpo se revela em busca de um sentido para a ação, ainda que as hesitações nos avassalem – como se elas não fossem motor e avanço e descoberta.

Convocando pensadores fortes como Steiner, Heidegger, Bachelard, Ortega y Gasset, Wittgenstein, Barthes, Adorno, Vergílio Ferreira, Nietzsche e tantos outros, estes atlas é um manual de sobrevivência cultural, uma central de energia que nos invade, dando-se, sendo em nós.

2013-12-20

OS LIVROS DE 2013: Manuel Gusmão, «Pequeno tratado das figuras», Lisboa, assírio & alvim, 2013 [fevereiro].


OS LIVROS DE 2013: Manuel Gusmão, Pequeno tratado das figuras, Lisboa, assírio & alvim, 2013 [fevereiro].

É um raro tratado poético este livro. Dividindo-se em «O caderno das paisagens», «Os desenhos do escultor ou notas sobre o trabalho da inspiração – um poema em memória do Jorge Vieira», «No labirinto das imagens – o que falta para serem um filme?», «Filmar o vento» e «A pintura corpo a corpo – os corpos da pintura; pintores pintados», o Pequeno tratado das figuras de Manuel Gusmão exalta-se em movimento de aracne, desvelando a tapeçaria, a armadilha textual que é composta por «Ramos lianas folhas e fios» (p. 11) que tecem «a clara teia» que envolve, enreda e devém memória como marca de água na página em branco que deseja permanecer. Como Anteu, é na terra que a poesia ganha força, é aí que as palavras  queimam  e dizem «do surdo clamor/ do mundo, do vivo enquanto vivo» (p. 21).
Áspero, duro, pleno de marcas e cicatrizes, o «tratado» abre-se ao olhar, homenageia em memória a criação (de Jorge Vieira, por exemplo) e capta os inícios da possibilidade. As palavras são tintas sobre tintas, inscrições sobre inscrições devindo. Criado, o poema mostra a metalurgia, a fuselagem, as figuras da criação e o vento hábil. Perto, os desenhos e as pinturas são sangue, «corpos / atómicos, em relevo nas margens da luz, / estremecendo crepitantes» (p. 39).

Fundo, este Pequeno tratado das figuras é grande como tudo o que é essencial – a arte, v.g.

2013-12-19

UHF na Casa da Música (18 de dezembro de 2013)


Semeando e correndo, mais do que de cavalos rapidíssimos, eis chegada a hora. Longe, muito perto aqui, a disseminação colhe-se nos dedos, na palma da mão e no rigor cordial, isto é, do coração. Transbordando, empolgando, os UHF são um caso de descaso - umas vezes estranhamente esquecidos, outras mal avaliados, mereceriam um outro país?
Nacionais e portugueses, afirmando a língua, o grupo percorreu em cerca de 3 horas uma antiga estrada que felizmente conheço. Vibrantes, rudes, afetuosos, sem rede, levaram a música à Casa com a naturalidade de uma estruturada oficina que conhece o seu mester e aos seus oferece o melhor.
Desabando, o céu caiu-nos em cima rindo e chorando de contentamento. E até o nevoeiro nos fez ver que era a HORA...

2013-12-18

OS LIVROS DE 2013: Herberto Helder, «Servidões», Porto, Assírio & Alvim, 2013 (maio).


OS LIVROS DE 2013: Herberto Helder, Lisboa, Assírio & Alvim, 2013 (maio).

Inconcluso e decetivo relativamente ao que é uma cabeça, como o diz o paratexto inicial, é toda uma cerebralidade memorial que logo ascende na «prosa» inicial (pp. 9-18) – é um tempo devastado, fundo, mineral e zoológico que povoa a meninice e o adolescer lá longe, é até um eco brandoniano que se despega fulgurante do fundo da primeira página: «Uma noite acordei com o som dos meus próprios gritos» (p. 9). Orgânicas, febris, pérfidas, perversas, quentes, na cabeça todas as imagens devinham mágicas e ácidas, como um antiquíssimo bestiário maligno e redentor. Não falta aí sequer o rito vergiliano do espanto especular. Desde aí, uma espessa cicatriz de liberdade e de insujeição não mais deixará o poeta.
A  poesia diz-se herbertianamente «nunca uma chegada seja ao que for» (p. 12) e uma difusão dos chamados «ganhos fundamentais». Devorante, sem mundo material, eis a limpidez da gramaticalidade.
Observando-se, o Poeta interroga as suas servidões («dos trabalhos do mundo corrompida / que servidões carrega a minha vida» [p.19]), os caminhos da desmemória e um à frente suspenso: « e eu esteja atrás vivendo desse próprio esquecimento, / a mão cortada, cortado o nome, além da morte escrita, / pelo buraco da voz o nome escoado para sempre» (p. 117).

Fulgurante, em história poética fulgurantíssima, como não ficarmos presos por estas Servidões de Herberto Helder?

2013-12-17

OS LIVROS DE 2013: Alberto Manguel e Gianni Guadalupi, «Dicionário de lugares imaginários», Lisboa, TINTA-DA-CHINA, 2013 (agosto).


OS LIVROS DE 2013: Alberto Manguel e Gianni Guadalupi, Dicionário de lugares imaginários, Lisboa, TINTA-DA-CHINA, 2013 (agosto).

Denegando os lugares, eis que uma boa parte da cultura e dos seus ecos vem até nós, em evidência nunca assim vista. Obliterando a materialidade hoje tão espiolhada, Manguel  e Guadalupi (RIP) levantam, em inventário que não «inventa», os «loci» imaginários que, sublimando o real, não o são, sendo-o.
Compêndio de evasão, de errância, de mitemas e de desejos, este dicionário é um lugar de muitos lugares, é uma viagem dentro e fora, uma contemplação que sabe o seu espaço – um além que o é, não o sendo ainda. E sendo-o.

De ABADIA, A a ZYUNDAL este dicionário é claramente obrigatório não só para os amantes das utopias. E, afinal, quem nelas não vive, podendo-o fazer?

2013-12-16

OS LIVROS DE 2013: Urbano Tavares Rodrigues: O livro aberto de uma vida ímpar, Diálogo com José Jorge Letria, Lisboa, Guerra & Paz, 2013 [setembro].


OS LIVROS DE 2013: Urbano Tavares Rodrigues: O livro aberto de uma vida ímpar, Diálogo com José Jorge Letria, Lisboa, Guerra & Paz, 2013 [setembro].


Trabalhando os afetos com mestria, José Jorge Letria levantou, neste final de novembro, uma das belas histórias literárias de amizade. Urbano Tavares Rodrigues, «fraterno e firme», como a abertura poética o diz, mostra-se como foi e é em nós – um monumento artístico e um prodígio de humanidade. Esta vinda a lume de uma conversa entre os dois escritores havida por dezembro de 2010 é um testemunho fundamental sobre um dos não muito escritores que trabalharam para a cultura portuguesas durante sessenta anos ou mais – ouvir Urbano em direto é saber que há mortes impossíveis e que há vidas que não cessam de nos iluminar.

2013-12-15

OS LIVROS DE 2013: Carlos Clara-Gomes, «crónicas do inverno», Viseu, Edições Esgotadas, 2013 [outubro].


OS LIVROS DE 2013: Carlos Clara-Gomes, «crónicas do inverno», Viseu, Edições Esgotadas, 2013 [outubro].
Perseguindo um tempo de palavras ditas e cantadas, na modulação do imediatismo comunicativo, estas crónicas chegam-nos da ação performativa. Recuperando a eficácia e o peso da verbalização, eis a luz do palco e a subtileza oral dos aedos – este livro antes de o ser já o era, dito e representado em direto antes do diferimento de objeto publicado.
Do contador, falam as palavras; da envolvência, também o contador fala. Encenadas, os ditos, ora finamente poéticos, ora ferinos como lâminas, trazem a escatologia de um modo de ser, de um modo de evocar, de um modo de esquecer. Desvelando-se, o sujeito condutor escreve-nos e inscreve-nos numa viagem que todos conhecemos, mesmo que o tenhamos esquecido.

Estas crónicas, magnífico derrame de histórias e ulcerações, merecem o melhor de nós – uma presença atenta, na mostração, e uma complementar leitura para outra compreensão. E o inverso também não é pior. Viver é isso: é aprender, é viver, é encostarmo-nos a estas palavras urgentemente, como quem aprende…

2013-12-14

OS LIVROS DE 2013: Eugénio Lisboa, Acta est fabula. Memórias - III - Lourenço Marques revisited (1955-1976), Guimarães, Opera Omnia, 2013 (outubro).


Estes escritos de Eugénio de Lisboa haverão de constituir um dos mais importantes documentos memorialistas sobre a cultura portuguesa do século XX. Compreendendo um espaço temporal entre 1955 e 1976, o nosso «maître à penser» escreve-se, no sentido de George Bernard Shaw, apresentando-nos um quadro luminoso sobre a sua vivência moçambicana e conexa aproximação às belas letras: desde o fascínio profundo com Fialho de Almeida, passando pela rendida admiração por Reinaldo Ferreira e a estreita amizade com Rui Knopfli, o fascinante encontro com Grabato Dias (António Quadros) e Zeca Afonso, até tantas outras figuras maiores da «feira cultural laurentina» - Alberto de Lacerda, João da Fonseca Amaral, Craveirinha, Virgílio de Lemos, Glória de Sant’Anna…

Avultam ainda viagens sentimentais, leituras, pensamentos e influências que nos ajudarão a melhor interpretar os signos em volta. Tais marcas, fortíssimas, são aqui o pagamento de uma dívida de Eugénio Lisboa à cidade de Lourenço Marques. Quem não quererá ter uma dívida assim?

2013-12-13

OS LIVROS DE 2013: Eu sou uma antologia – 136 autores fictícios de Fernando Pessoa – Edição de Jerónimo Pizarro e Patricio Ferrari [Lisboa, Tinta-da-China, MMXIII (novembro)].


OS LIVROS DE 2013: Eu sou uma antologia – 136 autores fictícios de Fernando Pessoa – Edição de Jerónimo Pizarro e Patricio Ferrari [Lisboa, Tinta-da-China, MMXIII (novembro)].

É uma nova luz sobre Pessoa este olhar atento sobre a desmultiplicação. Partindo da perplexidade pessoana  de não saber quantas almas tinha, Pizarro e Ferrari, provando que a consistência não tem idade nem pátria, encaram a «escritura» com o rigor dos apaixonados – amar é afinal perder quaisquer transbordamentos e respeitar o que está como quem sabe o que está. Esta lição filológica vem muitas vezes de fora. Dentro, há um emaranhado de quintinhas que torna os autores estéreis e manobráveis. Integrando e excluindo, e sempre explicando, este trabalho é, sem dúvida, um lugar maior sobre a magnífica orquestração daquele que disse: «sejamos múltiplos, mas senhores da nossa multiplicidade».

Não ver esta antologia em Pessoa é não ver a literatura em 2013 servida sabiamente por quem sabe. O resto é Pessoa e os estilhaços calculados.

Serão à volta de Aquilino: 1) «Aquilino Ribeiro como fonte de inspiração na valorização da biodiversidade e na cultura do "genius loci" das Terras do Demo» pelo Dr. Paulo Barracosa; 2) Apresentação do nº 21 dos «Cadernos Aquilinianos».


2013-12-10

O pintor Artur Loureiro nas «Cartas da Montanha» de João de Araújo Correia


As «Cartas da Montanha» (1955) são, para mim, um poderosíssimo livro do «Mestre de nós todos». A primeira entrada, de título «Recordação do Porto» e datada de 1948, é dedicada ao Porto, ao Palácio de Cristal e principalmente a um primeiro encontro com Mestre Artur Loureiro, que é aqui motivema poético e central. Transcreva-se o «explicit» e aprecie-se o rigor poético de uma prosa enxuta, quase única:

«Despedi-me do Mestre. Despedi-me do velho que só tomava leite para ter saúde e se erguia cedo para trabalhar. Despedi-me do profissional que elogiava o "amador" e lhe queria a ponto de lhe negar a doença para se consolar. Despedi-me do Palácio e esqueci o bonde. Esqueci-me de tudo quanto era feio. Desci a pé até à "Brasileira". Tomei café. Próximo da minha mesa, numa tertúlia, enterravam-se vivos os homens de talento.» [João de Araújo Correia, «Cartas da Montanha», Régua, Imprensa do Douro, 1955, pp. 15-16].

Noite fulgurante, Mestres Artur Loureiro e João de Araújo Correia!

2013-12-09

[EU LISPECTOR]


EU LISPECTOR
eu lispector
tu lispector
ela lispector
ele lispector
nós lispector
vós lispector
elas lispector
eles lispector

como um grito
eis o prazer
de conjugar a literatura

sem acordo e com cê .

2013-12-06

Hoje é dia de Urbano Tavares Rodrigues... e depois também!


Como uma lição, em dia de Urbano Tavares Rodrigues, ouça-se-lhe a voz e a admonição:

«Por toda a parte os mais fortes vencem os mais fracos, nem os deixam chegar-se ao festim da vida.
Terá de ser sempre assim, Liriana?». ["explicit" de «Nunca diremos quem sois», 2002, p. 213].

2013-12-05

Celebração do 90º aniversário de Urbano Tavares Rodrigues, com a projecção do filme documentários de António Castanheira "Memória das Palavras", seguida de conversa informal.


Celebração do 90º aniversário de Urbano Tavares Rodrigues, com a projecção do filme documentários de António Castanheira "Memória das Palavras", seguida de conversa informal.

2013-12-02

Pensamento assistido com Urbano Tavares Rodrigues


Ir por aí «fora até ao beijo do mar, celebrar a glória da chegada» (Urbano Tavares Rodrigues, Nunca diremos quem sois, 2002, p. 20) de um outro tempo...

2013-11-28

A fábula da história dos professores

'Todos os dias, uma formiga professora chegava cedinho à escola
cid:6BF23707A2D94F24ABCE38C741707D78@marbormq.com.br
e pegava a sério no trabalho
cid:69F4BC30E94C430294C95D999E931FA2@marbormq.com.br
A formiga ensinava e era feliz.
cid:86169EEF61A54D2CA47B0DDBDB96C58C@marbormq.com.br
O Ministro besouro cid:A28769D60DA1463BA89C9422601F4E55@marbormq.com.brestranhou a formiga trabalhar sem supervisão.


Se ela ensinava tão bem sem supervisão, seria ainda melhor se fosse supervisionada.

E colocou uma barata, cid:EECFC184DD444FA7A49E42DB7894CDF4@marbormq.com.brque nunca tinha leccionado, mas preparava belíssimos relatórios e tinha muita experiência, como secretária de estado.


A primeira preocupação da barata foi a de padronizar o horário de entrada e saída da formiga.

Pouco depois, a barata precisou de uma secretária para ajudar a preparar os relatórios e contratou também

uma aranha cid:7D9ABFCD99414F66B680F1259DD9B57E@marbormq.com.brpara organizar os arquivos e controlar as ligações telefónicas.

O besouro ficou encantado com os relatórios da barata e pediu também gráficos com indicadores e análise das tendências que eram mostradas em reuniões.
A barata, então, contratou uma mosca,
cid:02F7D8FE9214468F9C7DB41195FE1481@marbormq.com.br
e comprou um computador com impressora colorida. Logo, a formiga produtiva e feliz, começou a lamentar-se de toda aquela
movimentação cid:ECAE41C5792E4D91AFA8FD0B2B42CB25@marbormq.com.brde papéis e reuniões!

O besouro concluiu que era o momento de criar a função de director para a escola onde a formiga ensinava e era feliz.

O cargo foi dado a uma cigarra, cid:8190568485C541DC879F4BE1F2AC13CD@marbormq.com.brque mandou colocar uma carpete no seu escritório e comprar uma cadeira especial..

A nova directora cigarra logo precisou de um computador e de
uma sub directora, a pulga cid:5F2E8264005B47BCB4AE30A0A1A30A5C@marbormq.com.br

para ajudá-la a preparar um plano estratégico de melhorias no ensino e o controlo do orçamento para as salas onde trabalhava a formiga, que já não cantarolava e cada vez ia ficando mais aborrecidacid:F8269A1AF8874226B211C486187B51EC@marbormq.com.br

A cigarra, então, convenceu o gerente besouro, que era preciso fazer um estudo do clima.

Mas, o besouro, ao rever os relatórios, deu-se conta de que a turma na qual a formiga era professora não atingia os objectivos.

como antes e contratou a coruja, cid:58F4F3991E134092B2CC7AACC722BBF4@marbormq.com.bruma prestigiada consultora, muito famosa, para que fizesse um diagnóstico da situação. A coruja permaneceu três meses na escola e emitiu um volumoso relatório, com vários volumes, que concluía: Há muita gente nesta escola!!

E adivinhe quem o besouro mandou demitir?

A formiga, claro, porque andava muito desmotivada e aborrecida.
cid:6329A299A71C4AA5B98C610C6ADDD337@marbormq.com.br
Já viu este filme antes?

Bom trabalho a todos os Docentes!!!

2013-11-26

O nascimento de Baltasar Sete-Sóis no conto «História dum pastor» de João de Araújo Correia


O nascimento de Baltasar Sete-Sóis no conto «História dum pastor» de João de Araújo Correia:

«Conheço a serra como as minhas mãos. Que estou eu a dizer? Conheço-a melhor que as minhas mãos. Como o senhor vê, sou maneta. Perdi o braço num grande barulho, armado entre o meu povo e aquele povo de além. Somos vizinhos, mas, não nos podemos ver desde o princípio do mundo.

O pior é que fiquei maneta. chamavam-me, dantes, o Dionísio. Como perdi o braço, também perdi o nome. Puseram-me, de alcunho, o Maneta. Quem vai ali com o gado? É o Maneta...
Eu próprio, olhando para mim, vi outro homem. quem era aquele moço, que trazia suspenso, do ombro direito, o balandrau dum morto? Era eu, o Dionísio? Duvidei.» [João de Araújo Correia, «Folhas de Xisto», Régua, Imprensa do Douro - Editora, 1959.]

2013-11-23

Herberto, Herberto Helder...


Silêncio, que o dia é de Herberto Helder:

«Ninguém tem mais peso que o seu canto.
A lua agarra-o pela raiz,
arranca-o.
Deixa um grito que embriaga,
deixa sangue na boca.
Que seja a demonia: - a arte mais forte de morrer
pela música, pela
memória.»

[Herberto Helder, «Última ciência», Lisboa, assírio & alvim, 1988.]

SEM UM TU NÃO PODE HAVER UM EU coreografia e interpretação PAULO RIBEIRO

DANÇA | 23 NOV
SEM UM TU NÃO PODE HAVER UM EU
coreografia e interpretação PAULO RIBEIRO

Estreia Absoluta

Em Sem um tu não pode haver um eu, Paulo Ribeiro não só regressa ao palco, como o faz sozinho, apenas com Ingmar Bergman, para talvez construir uma coreografia feita de várias felicidades. Mergulha nas “verdadeiras palavras, aquelas que transportam a vida, as que estão cheias de sentidos, as que Ingmar Bergman filmou acompanhadas de horas, fantasticamente longas, de vida vital”. “É com estas palavras e as suas músicas que eu gostaria de voltar a dançar e talvez, desta vez sim, dançar pela última vez...”, escreve o coreógrafo. 

Em 31 anos de carreira, Paulo Ribeiro dançou o seu primeiro e único solo, Modo de Utilização, em 1991, na Bienal Universitária de Coimbra (BUC). Em 2006, depois de ter dançado, precisamente,Malgré Nous, Nous Étions Là anunciou que não voltaria ao palco como intérprete, mas em JIMpercebeu-se que a quebra desse voto estaria iminente e assim é.

Coreografia e interpretação Paulo Ribeiro
Música Robert Wyatt, Insensitive
Franz Koglmann, O Moon My Pin-UpThird Movement, Distinctions – IX;  
Bach / Cello Suites (Pablo Casals), Cello Suite #5 In C Minor, BWV 1011 – Prélude; 
Bach / Cello Suites (Pablo Casals), Cello Suite #5 In C Minor, BWV 1011 – Courante
Magnus Lindberg / Ictus Clarinet Quintet, Related Rocks
Figurinos José António Tenente
Desenho de luz Nuno Meira
Produção Companhia Paulo Ribeiro
Coprodução Centro Cultural Vila Flor, Centro Cultural de Belém e Teatro Nacional São João 
Parceria Teatro Viriato
Agradecimentos Dr. António Ribeiro de Carvalho, Dr. João Luís Oliva, Dra. Maria José Arêde, Henrique Tomás, amigos presentes em todos os momentos

© Foto José Alfredo

2013-11-20

Pensamento assistido com Eugénio Lisboa


Os mestres são assim - para uma vida inteira:

«Nunca escondi nem procurei, de algum modo "matizar" as minhas amizades. Nunca escolhi ou rejeitei amigos, por razões ideológicas: tão só, pelo seu carácter. É claro que fui amigo, até assíduo, de comunistas.» [Eugénio Lisboa, «Acta es fabula. Memórias - III - Lourenço Marques revisited (1955-1976), Guimarães, Opera Omnia, 2013, p. 56.]

Afinal, quem tem medo das palavras?

2013-11-19

Sessão de lançamento dos livros "Ciganos Portugueses: Olhares Plurais e Novos Desafios numa Sociedade em Transição" e "Ciganos Portugueses: olhares cruzados e interdisciplinares em torno de políticas sociais e projectos de intervenção social e cultural", de Olga Magano e Manuela Mendes (investigadora associada do Instituto de Sociologia).


Vai hoje lugar, pelas 18h30, na sala de reuniões, a sessão de lançamento dos livros "Ciganos Portugueses: Olhares Plurais e Novos Desafios numa Sociedade em Transição" e "Ciganos Portugueses: olhares cruzados e interdisciplinares em torno de políticas sociais e projectos de intervenção social e cultural", de Olga Magano e Manuela Mendes (investigadora associada do Instituto de Sociologia). 

As obras têm a chancela da Editora Mundos Sociais e serão apresentadas por António Teixeira Fernandes, Manuel Carlos Silva e Rosário Farmhouse. 

A entrada é livre.

2013-11-18

«Amor como em casa» de Manuel António Pina


[AMOR COMO EM CASA] de Manuel António Pina ...

Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraidíssimo percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde no café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.

[Manuel António Pina, Ainda não é o fim nem o princípio do mundo calma é apenas um pouco tarde, Porto, a regra do jogo, 1974, p.34.]

2013-11-16

Apresentação de «Montemuro» de Carlos Clara Gomes


AXIOMÁTICA DE «MONTEMURO»

A [ALFA] - Experiencial, este romance diz estar onde está – no lugar escolhido que é profunda morada de responsabilidade. A
[DOIS] – Evocativo, multiforme e larvar, o texto clariano dimana palavras alarmadas e responsabilizantes, em tempo sem tempo e em momento avassaladoramente trágico para as democracias, os povos e as gentes.
[TRÊS] – George Steiner, em conferência proferida em Amesterdão no ano de 1969, afirmou: «A Europa suicidou-se, ao matar os seus judeus.» Transcorridos mais de 40 anos, assistimos, quase impávidos, à destruição das nossas vidas, por força das medidas «inevitáveis» que nos levam a nova barbárie – e dizer escravatura não é exagero, no meio de chavões e palavras disruptivas como ‘corte brutal’, ‘autoagressão’, ‘submissão a lógicas estratégicas e económicas’, ‘derrapagem’, ‘esmagamento’, ‘tortura’, ‘desalojado’, ‘violação’, ‘dolo’, ‘suicídio’, ‘espiral recessiva’, ‘cortes’, ‘inevitabilidades’ e outros que bem conhecem.
[QUATRO] – Deseuropeus e desumanistas, os tempos obrigam a contrações, fechamentos e regressos. É do regresso à condição cultural que falo, da preservação e da dignificação dos lugares do espírito que, assim o queiramos, não podem ser esmagados. Envelhecer hoje num dos países mais envelhecidos do mundo é desesperante. Como desanimador é também vermos o corrupio dos nossos jovens mais ou menos talentosos para longínquas terras à míngua de Pátria. Este livro de Clara Gomes fala de nós, dos nossos lugares, das nossas gentes. E isso é já um incentivo a sermos.
[CINCO] – Como em Luís Miguel Nava, estamos em Viseu e «o tempo dá de súbito um salto para trás»[1], e eis que o magnífico objeto que é o livro esplende como o ouriço de Derrida à espera do nosso corpo. Fugindo à escravidão latente, é o livro, como nas mediévicas eras, um refúgio seguro. Dos poucos, acrescento, e quiçá o único!
[SEIS] - Eis Montemuro que nos convida para o significado e para o poder da arte – aqui passarão marginados e incompreendidos; equívocos, logros e lealdades; interditos e contrastes; lugares próximos e muito próximos; diáspora e equilíbrios; amores e desatinos; vida e morte – e tudo somando vida para a morte.
[SETE] – Montemuro é um luminoso in memoriam. Sabendo que tudo se decide no pormenor e no estancamento das modernidades detersivas, a obra de Clara Gomes articula-se em rosácea, a partir de uma «carranca de espectador», deflagrando círculos de fogo, de vida, que se fecharão fulgurantemente em clave aquática sobre a gesta de uma família.
 Ω [ÓMEGA] – Platão ordenou que não entrasse na sua academia nenhum ageómetra. Julgo que aqui não terão entrado desabituados da leitura e não leitores. Os tempos são de vigilância e de reflexão. Estes textos, assim escavando a nossa íntima condição são, mais do que úteis, necessários. Perante nós está este Montemuro, na sua «quididade», que vamos comer e também beber, porque a leitura «reclama silêncio e um isolamento feroz»[2] com um outro texto que estas palavras ainda não são, nem poderiam ser. E muito por isso a existência vale a pena – por este modo sobrevivente de contar uma estória que é a nossa história. Ensinando-nos o coração, Montemuro é um convite à Jacques Derrida:
«Come, bebe, engole a minha letra, porta-a, transporta-a em ti como lei de uma escrita em que o teu corpo se tornou: a escrita em si[3] Ω.
À leitura, pois…

                                                                                    Viseu, 15 de novembro de 2013
                                                                       Martim de Gouveia e Sousa

                                                                                                               




[1] Luís Miguel Nava, O céu sob as entranhas, Porto, Limiar, 1989, poema “Regresso».
[2] George Steiner, No castelo do Barba Azul. Algumas notas para a redefinição de cultura, Lisboa, Relógio d’Água, 1992, p. 123.
[3] Jacques Derrida, Che cos’ è la poesia?, Coimbra, Angelus Novus, Editora, 2003, p. 7.

«Montemuro» de Carlos Clara Gomes


Carlos Clara Gomes, Montemuro, «Resus», Viseu, Edições Esgotadas, 2013. Ilustração da capa de Wilfred Hildonen. Revisão do texto de Ana Maria Oliveira. Prefácio de Martim de Gouveia e Sousa. 

2013-11-08

Uma greve contra o esmagamento de um país


Uma greve contra a desgovernação.

Pensamento assistido por Cândido de Figueiredo


«Portugal, um país microscópico, de origem neo-visigótica, pôde manter a sua autonomia por dez séculos. Meado porém o século XXI, já quase nada existia daquela nacionalidade, que teve na história alguns momentos de robustez e prestígio.» [Cândido de Figueiredo, «Lisboa no anno três mil» (Revelações hipnóticas), 1892.]

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A verdade da ficção...