2011-12-31

Sobre um artigo na última "Anim'arte"


Chegou-me há pouco a última revista Anim'arte de 2011, que mereceu, como habitualmente, o meu sincero aplauso. Um aspeto, porém, merece um vivo reparo: no artigo de Luís Filipe Gonçalves, "Um dia com os Poetas de Viseu", há uma deriva incompreensível com os nomes dos grandes poetas António Franco Alexandre e Luís Miguel Nava, que faz pressupor o pouco contacto do articulista com a poesia dos autores utilizados - se o cartaz alude a uns irreconhecíveis Luis Nava [sic] e António Alexandre[sic], o miolo do texto permite as estranhas oscilações Miguel Nava [sic], Alexandre Franco [sic!!!!] e até Orlando Oliveira [sic] para o grande aguarelista Rolando de Oliveira. Nota-se um repescamento textual em "seara alheia", bem como um critério ilógico no agrupamento poético.
Ainda assim, louve-se a intenção divulgativa do jovem estagiário. Quanto à revista, uita longa, non breuis...      

2011-12-30

"Os desertores" de Augusto Abelaira em final de ano



ontem foi o redol e o seu dia. mas foi ontem também que primeiro me apeteceu falar de augusto abelaira e do seu romance "os desertores", de 1960. diz assim o texto: «A época é de secura... O ano está findo. Eis aqui um acontecimento importante. Lembra-te: no dia 29 de Dezembro resolveste ser gentil, resolvemos ser gentis...» E já antes se dissera: «um novo ano é sempre uma incógnita».

a gentileza é hoje uma luta contra o esquecimento. infelizmente para nós, neste caso a literatura não tem razão e o ano que aí vem só esconde a perfidez do mal que nos querem continuar a fazer...

2011-12-29

Os cem anos de Redol


Passam cem anos. Os perscrutadores da coisa literária sabem-no. Redol é um fulgurante romancista. Nem sempre lido, por razões laterais, há no nosso escritor um modo único de olhar o sofrimento. E se as suas páginas assentam no sangue e na terra é porque a sua escrita ressuma de liricidade, de força emotiva, de emoção ingénita. Não adianto mais, nem nomeio uma obra para que nenhuma possa ser esquecida. E assim esta noite é deslumbramento. Um abraço, Alves Redol...  

2011-12-23

O Natal de Dina Silva

Que nenhuma crise vos arranque do coração a capacidade e o desejo de "amar, amar perdidamente..." nem vos impeça de continuar a ter nas vossas mentes "todos os sonhos do mundo...". 

E que nenhuma pedra no caminho, grande ou pequena, vos faça tropeçar ou cair.

Que a Poesia "preencha as vossas falhas".

NATAL

Foi numa cama de folhelho,
entre lençóis de estopa suja
num pardieiro velho.
Trinta horas depois a mãe pegou na enxada
e foi roçar nas bordas dos caminhos
manadas de ervas
para a ovelha triste.
E a criança ficou no pardieiro
só com o fumo negro das paredes
e o crepitar do fogo,
enroscada num cesto vindimeiro,
que não havia berço
naquela casa.
E ninguém conta a história do menino
que não teve
nem magos a adorá-lo,
nem vacas a aquecê-lo,
mas que há-de ter
muitos reis da Judeia a persegui-lo;
que não terá coroas de espinhos
mas coroas de baionetas
postas até ao fundo do seu corpo.
Ninguém há-de contar a história do menino.
Ninguém lhe vai chamar o Salvador do Mundo. 

                                                           Álvaro Feijó
POETRIA

Livraria Poetria
www.livrariapoetria.com

2011-12-18

O Natal do L'Arengario Studio Bibliografico


TO SPEND THE AFTERNOON (MERIGGIARE PALLIDO ASSORTO...)
To the people of Vernazza and Monterosso

To spend the afternoon, absorbed and pale,
beside a burning garden wall;
to hear, among the stubble and the thorns,
the blackbirds cackling and the rustling snakes.

On the cracked earth or in the vetch
to spy on columns of red ants
now crossing, now dispersing,
atop their miniature heaps.

To ponder, peering through the leaves,
the heaving of the scaly sea
while the cicadas' wavering screech
goes up from balding peaks.

And walking out into the sunlight's glare
to feel with melancholy wonder
how all of life and its travail
is in this following a wall
topped with the shards of broken bottles.

Eugenio Montale (from Ossi di Seppia, 1925. Translated by David Young)

After the violent flood on 25th of October (Cinque Terre, Liguria, Italia) the destroyed towns survive in the words of their poet. It needs money but also poetry to rebuild the garden walls.

---

MERIGGIARE PALLIDO ASSORTO
Alle donne e agli uomini di Vernazza e Monterosso

Meriggiare pallido e assorto
presso un rovente muro d’orto,
ascoltare tra i pruni e gli sterpi
schiocchi di merli, frusci di serpi.

Nelle crepe del suolo o su la veccia
spiar le file di rosse formiche
ch’ora si rompono ed ora s’intrecciano
a sommo di minuscole biche.

Osservare tra frondi il palpitare
lontano di scaglie di mare
mentre si levano tremuli scricchi
di cicale dai calvi picchi.

E andando nel sole che abbaglia
sentire con triste meraviglia
com’è tutta la vita e il suo travaglio
in questo seguitare una muraglia
che ha in cima cocci aguzzi di bottiglia.

Eugenio Montale (da Ossi di Seppia, 1925)

Dopo la terribile alluvione del 25 ottobre le terre cancellate sopravvivono nei versi del loro poeta. Ci vogliono i soldi ma anche la poesia per ricostruire i muri degli orti.

Merry Christmas / Buon Natale
Paolo & Bruno Tonini
*********************************
L'ARENGARIO STUDIO BIBLIOGRAFICO
Dott. Paolo Tonini e Bruno Tonini
Via Pratolungo 192
25064 Gussago (BS) - ITALIA
Member of ALAI-LILA
Iscritto all'Albo dei Consulenti
Tecnici del Tribunale di Brescia
Tel. ++39 030 252 2472
Fax  ++39 030 252 2458
e-mail staff@arengario.it
WebSite http://www.arengario.it
Libri antichi e moderni di pregio

2011-12-05

lipovetszky-xi

a luz irrompeu das trevas silente
e como em handke veio a solidão
um fio verde de inércia dilacerou
os pulsos tingindo os tecidos acne
áspero da derrelição sem revolta.

ato feito facto e funda dilaceração.

"Anima vegetalis - Imaginário botânico do Mosteiro de Tibães" - com fotografias de Paulo Gaspar Ferreira e excertos do Padre Teodoro d' Almeida


2011-11-28

lipovetsky-x

no deserto enfim
fim afundado lento
alento sobretempo
encontro de mim
nas asas do vento
a depressão e o flip
a inércia desertiva
contra o cool humano
vão moldando a noite
os vulneráveis coiotes
irrompem intestinos
e um puro narciso nasce.

2011-11-10

A benefício de inventário: Álvaro Cunhal



Álvaro Cunhal nasceu em Coimbra num dia 10 de novembro assim. Olhando o espetro político, à direita e à esquerda, poucos, muitos poucos dele se aproximaram em valor. Talvez nem ninguém acima. Ao lado, no século XX português, talvez um D. Carlos, um Sidónio Pais, um Salazar, um Adriano Moreira, um Mário Soares... Que diferença, quando olhamos para os atuais homens da nação. Sem discussão, Cunhal é um dos nossos maiores, reunindo uma completude invejável - quem assim político, ficcionista, ensaísta e artista plástico? Dos atrás citados, só D. Carlos era também um polivalente. Dos políticos no ativo, e pense-se até nos premiados europeus (Barroso, Constâncio...), a que distância não ficam todos?
  

Serões à volta de Aquilino - conversa com o Dr. António Fernandes sobre "Aquilino , republicano... mas não tanto"


2011-11-09

A benefício de inventário: Carlos de Lemos


Joaquim Paço d' Arcos, neste importante ensaio sobre o poeta Guilherme de Faria, manifesta, a páginas 24, o injusto esquecimento a que estava votado, ali por 1970, o também poeta Carlos de Lemos. Lembra o ficcionista português o facto de Lemos ter sido professor de Faria no Liceu de Passos Manuel e de ter publicado nas Novidades de 14 de Abril de 1927 um decisivo ensaio sobre a atividade literária do autor de Destino. Haja memória para ambos...

2011-11-06

estado da nação

[cartoon enviado por jaime viveiros portugal]