2007-02-23

Um olhar sobre "Outonalidades" de José Amaral







Seguindo pelo rito das estações do ano, sem que tal signifique ainda o estádio da matura idade literária que divisa um trajecto, este novo livro de José Amaral, com ilustrações de Ana Cristina Cruz, vindo a lume em Junho de 2006, com chancela da Papiro Editora, inscreve-se em linha ambivalente entre uma tradição lírica ingénua e um tardo-simbolismo mitificante.
A eficácia do primeiro segmento operativo logo ocorre no poema “Abelha”, aí se cultivando um despojamento de linguagem fomentador da tal ingenuidade lírica indutora de perfeitos quadros poéticos sem especial fractura hermenêutica: a derradeira estrofe, pela singeleza e pela possibilidade onírica, corta sapiencialmente o narrativismo das estrofes anteriores e instaura um canónico culto da “bela natureza” azulescente e/ou colorante. Comprove-se o asserto crítico, por exemplo, com os “explicit” de expectativa do citado poema e de “Amendoeira”, onde encontramos a “imensidão / do azul / do horizonte” (p. 13) a encaixar com os “estranhos bailados / no céu azul” (p. 17). Veja-se ainda o cromatismo de poemas como “Claridade”, aí se desvelando uma oficina poética cinérea de “versos amarelados” (p. 24).
Uma segunda e última linha possível é, por exemplo, a incisão decadentista-simbolista, visível, aqui e além, na estranhização linguística de poemas como “Amapolas” ou “Nuit”, no culto incontido dos raros vocábulos não só outoniços (‘argilosa’, ‘esquissos’, ‘famélica’, ‘exprobação’, ‘herífuga’, ‘selenografia’, ‘plúmulas’, ‘hipoacusia’…), no virtuosismo técnico-compositivo (poemas ordenados alfabeticamemte de “Abelha” até “Trágico”), nas “sinfonias labiais” de muitos poemas ou nos ritos formais.
Poeta longe do Outono, José Amaral procura ainda a tonalidade. Não espanta, até porque um escritor faz-se escrevendo, insistindo na dor reactiva. A toada divisada, como diria um C. S. Lewis, não é propriamente defeito, é antes “a primeira forma de sensibilidade rítmica”.
[Publicado no Jornal do Centro de hoje]

2 comentários:

Anónimo disse...

Interessar-me-ei... Não conheço nada do poeta...

isabel mendes ferreira disse...

Poeta longe do Outono, José Amaral procura ainda a tonalidade....



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tb não conheço...



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mas guardo a referência.



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bom dia Martim.


sempre.


aqui.


:))))

tb.